segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A paz é fruto da justiça

A Campanha da Fraternidade da Igreja no Brasil, realizada na Quaresma, discute nesta edição o tema «Fraternidade e Segurança Pública».
O secretário geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), Dom Dimas Lara Barbosa, concedeu entrevista à Assessoria de Imprensa da CNBB para falar sobre a Campanha.

–Quais são os objetivos da CF 2009?
–Dom Dimas Lara: A CF tem como objetivo mais profundo levar à vivência da Quaresma, tempo forte de conversão, em que por meio da oração, do jejum, da caridade, da escuta da Palavra, da vida comunitária, nos preparamos para viver de maneira mais concreta a própria Páscoa. A Campanha deste ano mostra a preocupação da Igreja com o problema da violência e da insegurança que assola a sociedade de maneira geral, nos grandes centros, no interior e no campo. Nosso objetivo é suscitar um debate sobre a questão da Segurança Pública, [conhecer] as causas da violência e a cultura do medo que reina em muitos lugares. Queremos promover uma cultura da paz em todos os âmbitos.

–O texto-base da CF 2009 fala em conflito e violência. Qual a diferença entre esses dois atos? Como lidar com cada tipo de situação?
–Dom Dimas Lara: Pode haver um conflito de ideias ou de decisões, por exemplo, no momento de uma assembleia escolher a prioridade da diocese ou da paróquia. Os conflitos podem surgir, inclusive, dentro da própria casa. A questão é a maneira como se vai resolver o conflito, se através do diálogo, buscando uma síntese, ou da força, da violência, de modo que as opiniões de uma pessoa prevaleçam diante da realidade do outro. Se por conflitos entendemos divergências, é evidente que, ao se trabalhar juntos, eles vão surgir. O conflito não precisa necessariamente levar à violência. Queremos trabalhar o conflito através do diálogo. Para mediar os conflitos mais sérios, podemos criar, no nível de Igreja, um ministério e, no nível dos poderes públicos, uma atividade institucional. Atualmente o principal mediador de conflitos é o juiz, o sistema judiciário que, diante de um conflito de interesses, verifica, à luz da legislação, quem é que tem razão. Existem propostas de leis para se ampliar essa mediação de conflitos de modo que não apenas advogados, mas também psicólogos, teólogos, possam atuar como mediadores de conflitos, por exemplo, entre casais.

–E a violência?
–Dom Dimas Lara: Se a violência existe, ela precisa ser denunciada. A sociedade tem o direito de defender, sobretudo aqueles que são mais vulneráveis. Sabemos que existe a violência doméstica gravíssima, sobretudo contra a mulher e a criança. Existe a violência dos grupos do crime organizado; há a violência tanto praticada quanto sofrida por policiais; existe o racismo, violência simbólica. Isso sem contar os abusos explícitos no que diz respeito aos direitos humanos: tortura nas prisões, trabalho escravo. Há casos em que é possível fazer com que essas violências cessem através de uma mediação, de um trabalho de reconciliação e de perdão. Há excelentes trabalhos como o da Pastoral Familiar, Pastoral Carcerária, Pastoral do Menor, que ajudam pessoas que, muitas vezes, estão vivenciando uma verdadeira desestruturação psicológica e familiar. Existem outros casos, no entanto, em que é preciso a denúncia profética para que a força da autoridade pública se faça valer. Aí o judiciário e a polícia têm mais eficiência. Não somos contra uma ação da polícia, mas ela não precisa ser feita de modo a combater a violência com mais violência. Quando a violência existe, a postura tem de ser de defesa, sobretudo, dos inocentes e mais vulneráveis.

–Como a Igreja vai agir junto às comunidades para trabalhar um tema tão complexo como Segurança Pública?
–Dom Dimas Lara: Acima de tudo a Campanha da Fraternidade quer suscitar o debate para que cada comunidade levante as situações de mais insegurança e violência presentes nela, questione sobre suas causas e procure se organizar para combatê-las pela raiz. Nesse sentido, a paz que queremos construir como fruto da justiça há de ser resultado de um mutirão, com a sociedade organizada atuando em parceria com as organizações da Igreja e o Poder Público para buscar soluções.
O texto-base da CF, no entanto, apresenta, como sugestões, várias pistas de ação. Algumas, evidentemente, valem para todos, como procurar conhecer a Defensoria Pública e fazer parcerias com ela para que, por exemplo, os pobres tenham um advogado que os defenda em casos de necessidade. As comunidades podem participar das conferências municipais, estaduais e nacional de Segurança Pública, organizadas pelo Ministério da Justiça que permite, ainda, a realização das chamadas Conferências Livres. Elas podem ser organizadas por qualquer comunidade, associação de moradores, condomínios. As conclusões destas Conferências Livres podem ser enviadas diretamente para o Ministério da Justiça, sem a necessidade de passar pela Secretaria Estadual e Municipal de Segurança Pública.

–Como despertar nas comunidades a responsabilidade pela Segurança Pública e pela promoção da cultura de paz?
–Dom Dimas Lara: Através da própria dinâmica da CF, que apresenta diversos subsídios. O texto-base é apenas o texto fundamental, a partir do qual foram elaborados outros como celebrações penitenciais, via-sacra, círculos bíblicos, encontros para as famílias, para a juventude, para as escolas. Além disso, o tema da CF é apresentado no Congresso Nacional e o texto-base enviado aos deputados, ministros e outras autoridades. O tema é discutido também nas escolas e universidades. A CF atinge desde as populações ribeirinhas, no Amazonas, até os condomínios das nossas grandes cidades. Nenhum outro instrumento da Igreja Católica no Brasil tem uma capilaridade como essa.

–A Campanha da Fraternidade tem um gesto concreto que é a Coleta da Solidariedade. Qual sua finalidade?
–Dom Dimas Lara: O gesto concreto é uma atividade peculiar, enquanto se trata de uma doação em dinheiro feita na coleta do domingo de Ramos. Com isso é constituído o Fundo Nacional de Solidariedade que financia projetos das mais diversas comunidades. Centenas de projetos, pequenos, médios e grandes, são financiados a partir desta colaboração. Essa é outra forma de colaborar com a Campanha da Fraternidade.

fonte CNBB

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