quinta-feira, 9 de julho de 2009

A verdade é a medida

As crises que se abatem sobre a humanidade, neste último quarto de século, contrastando enormemente com seus avanços admiráveis, indicam que é urgente uma nova intimidade com a verdade. A crise econômica, por exemplo, com suas incidências nefastas na ordem social, confirmando vergonhosos cenários de exclusão, está exigindo uma nova lógica nos ordenamentos da economia. Uma exigência que inclui o desmascaramento da lógica do lucro que estampa como verdade incontestável a assertiva do apóstolo Paulo quando escreve na Ia. Carta a Timóteo, seu amigo e discípulo: “Na verdade, a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro. Por se terem entregue a ele, alguns se desviaram da fé e se afligem com inúmeros sofrimentos” (6, 10).
A crise da vida pública nacional, atingindo instituições que devem primar pela seriedade e limpidez de suas ações e funcionamentos, como o Senado, não menos indica que se está vivendo uma crise ética e moral advinda do distanciamento da verdade, de práticas que a desconsideram, de relativizações ignorantes de seu sentido e alcance, produzindo prejuízos irreparáveis e passivos danosos. O epicentro das diversas facetas das crises que se abatem muda de cá para lá. Uma verdadeira dança. Desafios à Constituição, com propostas indecorosas e interesseiras, partidárias e alentadoras de vaidades pessoais e interesses grupais em detrimento do bem de todos. Nesse contexto, é broto de esperança, discute-se a premência de transformações na sociedade visando urgentes mudanças de comportamento, incluindo âmbitos diferentes da configuração de uma vida saudável e sustentável.
Os fóruns de debate que se multiplicam precisam incluir permanentemente na sua pauta a questão básica e insubstituível da verdade como medida. É indispensável o critério simples e essencial de que a pessoa se mede pela verdade. A verdade é a sua única medida. Todos estão e devem estar debaixo da verdade, da qual a existência, e cada ser recebem sentido e valor. Antes das estratégias e das lógicas de gestão, a verdade faz a vida, dando-lhe fundamento, dirigindo-a e levando-a ao seu termo. Na raiz da crise localiza-se a incompetência humana de ser - para a verdade e na verdade que é um bem constitutivo e decisivo para o ser humano e suas organizações. Aí começam os comprometimentos graves, com força para derrubar as mais consistentes estratégias e princípios de gestão nas complexidades das culturas e das sociedades contemporâneas.
A crise de fundo é a da verdade. Essa época contemporânea está caracterizada pela explosão da ciência em função da técnica e proliferação de ideologias, absolutizando verdades parciais ou os seus aspectos. As consequências estão estampadas na angústia, na indiferença ou nos delírios que se expressam nos fanatismos por ídolos ou pela excentricidade de hábitos e costumes. Contudo, esses aspectos parciais da verdade não possibilitam o encontro da verdade como fonte de sentido e com força de redenção. Há uma decepção e um desencanto na raiz impossibilitando o indispensável voltar-se para a interioridade transcendente. A vulgaridade e a mesquinhez de interesses e hobbies, sem grandes ideais ou projetos, vão enterrando as pessoas na apatia da falsidade e no instinto espúrio da manipulação e da posse que gestam quadros horrendos de corrupção.
Entre os riscos graves que a contemporaneidade enfrenta, está o que advém do comprometimento da verdade. É preciso aprender e exercitar-se na verdade. Viver na verdade tem um significado determinante para as relações sociais e para a sustentabilidade institucional. A convivência sustentável só é possível quando se funda na verdade. As crises graves deste tempo apontam que é uma exigência inadiável uma intensa atividade educativa e um empenho por parte de todos para que a verdade seja a referência insubstituível de comportamentos individuais, na definição de prioridades, na escolha dos ordenamentos.
É urgente reconhecer que no tratamento das crises se tornam indispensáveis os investimentos e formação da consciência moral. É determinante que hoje ocorra uma volta à referência fundamental que possibilita obter a resposta sobre o que é bem e o que é mal. Essa referência fundamental, silenciada por muitas razões, é Deus. É um risco desconsiderar esta verdade. Desconsiderá-la é correr o risco de titubear e perder rumos. A consciência capaz de fundamentar o agir na verdade não encontrará fora de Deus a sua integridade. De Deus vem a inteireza desta integridade. É curioso o episódio narrado por Mateus, 8, 28-34,quando a cidade foi toda ao encontro de Jesus, depois de ter ele curado dois possessos pelo demônio. Aqueles eram violentos e ninguém podia passar perto deles. No entanto, curiosamente, seus conterrâneos solicitaram a Jesus que se retirasse da região deles. Escolheram distanciar-se da verdade que é a medida.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Fonte: CNBB

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